Estamos falando de dom Antônio Affonso, bispo emérito de Taubaté, falecido em 2021 aos 101 anos, e das Irmãs Sacramentinas do Santuário da Adoração Perpétua, tradicional templo religioso de Taubaté, situado na antiga Rua das Palmeiras.
A dúvida surge, para quem conheceu dom Antônio e para quem conhece as irmãzinhas, porque tanto ele pertencia como elas pertencem a uma congregação religiosa que têm o carisma sacramentino, ou seja, fundada sob a égide do Santíssimo Sacramento. Os padres da congregação a que pertencia dom Antônio são chamados padres sacramentinos e as irmãs do Santuário da Adoração Perpétua são chamadas irmãs sacramentinas.
Para encurtar a conversa vamos respondendo que não são, não. Mas dom Antônio teve uma relação afetiva, histórica, e canônica com as sacramentinas.
A Congregação das Servas do Santíssimo Sacramento – nome original das sacramentinas – foi fundada em 1864, em Paris, pelo padre Pedro Julião Eymard, hoje santo canonizado pela Igreja Católica, reverenciado como o Apóstolo da Eucaristia. A congregação dos sacramentinos, de dom Antônio, foi fundada pelo padre Júlio Maria De Lombaerde, em 1929, na cidade de Manhumirim-MG, sob o nome de Congregação dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora.
As Irmãs Sacramentinas chegaram à diocese de Taubaté em 1939, vindas da França. Eram irmãs enclausuradas cujo carisma era a adoração ao Santíssimo Sacramento durante as vinte e quatro horas do dia, sem contato com o mundo exterior. No entanto, em 1965 a congregação passou por uma reforma, sob o espírito do concílio Vaticano II, que permitia às religiosas saírem do convento para trabalhos de catequese e evangelização, rompendo com o rigor da clausura e com o carisma original de São Pedro Julião Eymard, que a partir de então, ficava em segundo plano. Muitas religiosas não aceitaram essa mudança e o foco principal dessa resistência encontrava-se no santuário de Taubaté, onde a madre Maria Eymard, reconhecidamente uma pessoa santa e profundamente comprometida com a mística de São Pedro Julião Eymard, assumiu o risco de um cisma entre as sacramentinas, juntamente com outras coirmãs. A crise chegou até o Vaticano.
O conflito chegou ao seu ápice em 1981, justamente o ano em que dom Antônio Affonso tomava posse como quinto bispo de Taubaté. Da Santa Sé, que aprovava integralmente a reforma, veio a “sugestão” de que as religiosas de Taubaté constituíssem uma outra congregação, sob o conceito canônico de “Pia União”.
Conforme meu próprio relato na biografia de dom Antônio, “A intervenção de dom Antônio Affonso de Miranda foi decisiva nessa questão, não apenas pelo aspecto canônico, mas político e prático, que evitou traumas mais contundentes. (…) Firme em suas decisões bastante abalizadas, dom Antônio assumiu os riscos e a responsabilidade pela refundação da congregação das sacramentinas que, mesmo sem contar com o número canônico de religiosas, com o seu aval e sua bênção, foi instalada em 22 de fevereiro de 1996”.
Na verdade, não se pode tachar o imbroglio de “cisma” – talvez o melhor fosse “cisma branco” – já que as religiosas de Taubaté não se rebelaram contra as constituições originais da congregação, muito pelo contrário levantaram-se em defesa do carisma do seu fundador. Nesse sentido foram determinantes as negociações de dom Antônio junto à Santa Sé que acabou por aceitar o estado canônico das sacramentinas de Taubaté, numa concordância tácita com as razões das sacramentinas “reacionárias”.
Hoje, as irmãs sacramentinas de Taubaté, assumem a adoração perpétua ao Santíssimo Sacramento, em estado de semi-clausura, já que em ocasiões muito especiais, podem sair para fora do convento. E o principal: velam por Jesus Sacramentado, exposto em seu santuário da rua das Palmeiras, durante as vinte e quatro horas do dia. Exatamente como sonhou o fundador.
Henrique Faria