Eu era coroinha do padre José Luís, na Vila das Graças, durante os anos cinquenta, quando conheci o padre-celebridade-nacional daquela ocasião, numa das visitas que ele fez ao nosso bairro. Lembro-me que fiquei impressionado com a sua figura elegante e simples. Imagino que fosse por ocasião de alguma campanha eleitoral, já que ele, o Padre Calazans, foi um político de destaque entre os anos 1950 e 1966, quando exerceu os mandatos de deputado estadual (1951/1954 e 1955/1958) e senador (1959/1966).
Como senador por São Paulo, o padre Calazans foi o relator da Lei de Diretrizes e Bases, do ministério da Educação. Ao lado do padre Patrick Peyton, irlandês-norte-americano, foi determinante na mobilização das mulheres brasileiras para a Marcha da Família, com Deus pela Liberdade, perfilando-se com as lideranças que detonaram o movimento que destituiu o presidente João Goulart, em 1964, quando se iniciou o governo militar que se estendeu até 1985. No entanto, diante do rumo que tomou o sistema político brasileiro, passou a ser um grande defensor da redemocratização do país.
Não conseguiu sua reeleição para o senado federal nas eleições de 1966, quando foi eleito o professor Carvalho Pinto, ex-governador de São Paulo.
Família e Juventude o foco da sua atuação
Ordenado sacerdote no dia 8 de dezembro de 1934, teve sua primeira experiência pastoral na comunidade de Caçapava Velha, onde foi vigário coadjutor por dois anos. Em 1937 foi enviado para Roma onde fez doutorado em filosofia. Voltou para a sua diocese em 1939, tendo ocupado funções de vigário em Cruzeiro-SP, São José dos Campos-SP e professor no Seminário Menor Diocesano de Taubaté, no Ginásio Diocesano (atual Colégio Elite-IDESA) e do Instituto de Filosofia de Taubaté.
Teve um trabalho intenso entre a juventude e as famílias durante os anos 1940, quando foi o assessor diocesano da Ação Católica, movimento de vanguarda na Igreja do Brasil e da juventude operária. Foi fundador do movimento Emaús, curso de valores cristão e humanos para jovens; do movimento Colmeia, também destinado à formação de jovens católicos; do movimento Lareira, dirigido à formação de casais e famílias.
Foi um precursor das reformas litúrgicas implementadas vinte anos depois pelo Concílio Vaticano II, quando presidiu a uma missa na igreja do Pilar, em português – naquele tempo as missas eram celebradas em latim, e o padre ficava de costas para o povo – e de frente para o povo. O próprio padre Calazans afirmou em entrevista à revista Personalidade de Fé, que essa missa celebrada por ele foi a segunda missa celebrada em português no Brasil, tendo sido a primeira celebrada pelo padre Carlos Ortiz, também em Taubaté. Com idéias renovadoras, o padre Calazans havia voltado da Europa, onde já existiam movimentos favoráveis à celebração da missa versus populum e na língua própria de cada país. Na diocese de Taubaté esse movimento foi bastante polêmico, na ocasião em que a diocese era governada por um vigário capitular, monsenhor João José de Azevedo. O evento da igreja do Pilar criou problemas para os padres que a ele aderiram ao movimento, liderados pelo padre Carlos Ortiz, e, consequentemente ao padre Calazans, que acabou por se transferir para a arquidiocese de São Paulo, de onde lançou-se na política, sem que tivesse abandonado o seu ministério.
Uma bolsa de estudos para o menino órfão
O menino Benedito Mário Calazans nasceu em Paraibuna-SP, no dia 13 de março de 1911. Fez seu curso primário no Grupo Escolar Dr. Cerqueira Cesar, em sua cidade natal. Entrou no seminário diocesano de Taubaté em julho de 1922, em condição inusitada. Órfão de pai aos 11 anos, quando cursava o segundo ano do ginásio, sem condições de continuar seus estudos em um colégio particular, foi convidado pelo bispo de Taubaté, dom Epaminondas, a entrar para o seminário, numa deferência muito especial à memória de seu pai, um grande amigo. No entanto, segundo sua irmã Lygia, desde muito pequeno demonstrava, já em suas brincadeiras de criança, uma tendência para a carreira sacerdotal. Uma de suas diversões preferidas era “paramentar-se” de padre, à sua moda, e celebrar a Via Sacra com os coleguinhas. Criança ainda, gostava de cavalgar sua eguinha Borboleta e nadar no rio Paraíba, que passava pelo fundo do quintal de sua casa. Não gostava de peixe, mas era um pescador inveterado quando moleque.
Faleceu em São Paulo no dia 3 de janeiro de 2007, aos 95 anos, e foi sepultado em Paraibuna-SP.
(Fontes: Cúria Diocesana de Taubaté (Dados biográficos compilados por monsenhor Irineu Batista da Silva – Revista Personalidade de Fé, publicada por biblioteca.univap.br)
Henrique Faria