À época da renúncia do Papa Bento XVI, no Brasil, um filósofo escreveu que ele tinha a coragem de falar sério para um mundo infantilizado, quando outros “formadores de opinião” falavam coisas apenas para agradar o público. Referindo-se aos comentários sobre o afastamento do papa e a escolha de seu sucessor, no mesmo artigo, esse filósofo afirmava que não se queria de fato um papa, mas “um consultor de sucesso espiritual”. Achei a expressão formidável porque muita acertada. Verdade dita com coragem em pouquíssimas palavras.
Mais a frente ele escreve: “a maioria das pessoas quer apenas comprar, divertir-se, ter uma autoestima alta, gozar livremente, não sentir culpa alguma; enfim, ter uma vida moral de criança de dez anos de idade”. De novo, espantosa a capacidade de dizer coisas de modo objetivo e direto, revelando um pensamento claro e distinto. Segundo ele mesmo confessa em seu artigo, essas são qualidades suas aprendidas num colégio jesuíta.
O filósofo citado é Luiz Felipe Pondé. Toda segunda-feira sai um artigo seu na Ilustrada da Folha de São Paulo. Em seus artigos, ele costuma colocar em evidência que é necessário ter coragem de ouvir e, depois, pensar e refletir. Sem essa coragem não será possível mudar, crescer, amadurecer.
Em vários artigos meus, publicados nesse periódico, chamei a atenção para essa característica dos tempos atuais: a imaturidade. Muita gente se sente livre para fazer e dizer o que bem entende, porém, não quer assumir a responsabilidade pelos seus atos. Menos ainda, quer pagar a conta, isto é, não quer arcar com as consequências do que faz e diz. Em vez de se dar ao trabalho de agir como pessoa adulta e responsável, prefere lançar mão de subterfúgios, buscam um bode expiatório ou tentam uma saída na base do “jeitinho brasileiro”. Tentam entorpecer a consciência em vez de enfrentar os próprios pecados. Tem aqueles ainda, que querem ter um pé na estrada do mundo materialista, hedonista e egoísta e outro, ao mesmo tempo, no caminho do Reino de Deus. Desconsideram a máxima evangélica que diz ser impossível servir a dois senhores (cf. Mt 6,24, a propósito, vale refletir a passagem sobre o jovem rico, Mt 19,16-26). Há também, os que insistem nos seus direitos, mas, ressentem-se quando são cobrados de seus deveres religiosos.
Pondé, que não afirma ser um fiel da Igreja, apenas simpatizante, aponta, contudo, um ponto crucial da espiritualidade cristã. Ou enfrentamos corajosamente a verdade sobre os nossos pecados, sobre a moralidade de nossos atos, ou não vamos crescer espiritualmente. Restará, então, seguir uma espiritualidade infantilizada, a toda hora pedindo colo para Deus, fazendo bico quando é contrariado em seus desejos que se opõem aos princípios evangélicos ou mostrando carinha de coitadinho esperando que o papai passe a mão na cabeça dando aval para que continue a cometer livremente e sem culpa os pecados que prática.
No evangelho é fácil identificar Jesus acolhendo os pecadores. Contudo, lá está também, esse mesmo Jesus despedindo o pecador perdoado dizendo-lhe “vai, e de agora em diante não peques mais” (Jo 8,11). E quantas vezes ele devolveu a pergunta quando, sabidamente, o interlocutor queria apenas justificar seus atos, eximindo-se da culpa, para continuar em seu erro sem ter que “pagar a pena” por isso.
Pe. Silvio José Dias