Certa feita escrevi, em nosso jornal “O Lábaro”, um artigo, em que insinuei que nossos sacerdotes deviam ter uma formação muito mais espiritual do que acadêmica. Não desfiz da importância da boa formação em letras, filosofia e teologia. Queria dizer simplesmente que, para o padre, o empenho em sua dedicação à vida espiritual devia superar sobremaneira o empenho, também indispensável, nos estudos de um sacerdote.
Recebi elogios e observações bastante pertinentes por parte das poucas pessoas que lêem o jornal da diocese. Mas, afinal, gostei que meu artigo tenha sido lido. E gostei das observações que me foram endereçadas.
O ponto alto que um de meus leitores comentou comigo é o da necessidade de maior presença dos padres no confessionário, e de maior disponibilidade de alguns, que, de fato, “tiram o corpo fora quando procurados para ouvir confissões”. Isto é grave e para mim decepcionante: que “padres tiram o corpo fora quando procurados para ouvir confissões”.
Este observador, pessoa séria, atuante no meio de nosso laicato, inclusive, acrescentou este sensato comentário num e-mail que me enviou: “Eu fico contente que o senhor, que pode fazer isto, chame nosso clero à atenção para esse relevante detalhe de sua missão pastoral. O que mais o povo espera de um padre é que ele seja, verdadeiramente, pastor e pai. Ser pai significa ouvir, perdoar, aconselhar. Ser Pastor significa conduzir. Mas, como?, se filhos e ovelhas não conseguem encontrar o Padre?” E acrescenta em seu e-mail: “Conto-lhe o que pessoalmente presenciei: Estava com um Padre, de cuja amizade muito me honra de privar, e, de fato, batíamos um papo descontraído, que em nada lhe impedia que ele o interrompesse, e foi quando chegaram duas senhoras e pediram à secretária perguntasse ao Padre se podia ele atendê-las em confissão. A secretária, delicadamente, interrompeu nossa conversa, e veio dizer que duas senhoras desejavam ser ouvidas em confissão. Dispus-me a sair, e levantei-me, apertando a mão do Padre. Mas, qual não foi meu desaponto, quando ele, simplesmente, respondeu à Secretária: ‘Agora não posso ouvir confissões… Somente no sábado, das 15h às 18hs’…”.
Outro caso (na verdade, eu tenho alguma dúvida sobre como realmente aconteceu), mas parece-me que foi o seguinte: estavam dois padres juntos na mesma sala, a que o público tem acesso, os dois muito benquistos entre o povo, e “disputados” para aconselhamento… Uma senhora dirigiu-se a um deles pedindo ser atendida em confissão. Ele disse não poder atendê-la naquele momento. A senhora pediu desculpa pelo incômodo, e foi saindo. Mas o outro Padre a chamou, e se dispôs a atendê-la. Terminada a confissão, deu-se um desagradável e inesperado acontecimento: a penitente sentiu-se mal, foi preciso chamar um “Regaste” para leva-la ao Pronto-socorro, onde veio a falecer.
Doloroso o desfecho desse caso. E encerra uma lição para todo padre. Comigo já sucedeu. Após a Missa, uma senhora pediu-me confissão. Atendi-a ali na sacristia. Por coincidência, o Pároco bateu uma foto, no instante em que eu lhe dava a absolvição. Ninguém podia prever o que aconteceria pouco depois: a mulher saiu após alguns momentos de oração, e na rua, à pequena distância, sucumbiu a um enfarte.
Guardo comigo a fotografia que foi batida pelo Pároco no momento em que eu a absolvia. É a inesquecível lembrança de um fato profundamente tocante no desempenho de seu ministério de confessor. No Céu, creio que essa mulher reza sempre por mim.
Encerro, lembrando a todos os sacerdotes que o dever de estar disposto ao atendimento de uma pessoa que solicita a confissão, é um dever muito sério, que pode trazer à consciência dos confessores, culpados pela recusa, consequências para a eternidade.
Dom Antonio Afonso de Miranda, sdn
Bispo Emérito de Taubaté
Fonte: O Lábaro – novembro/2015
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