Na celebração do Padroeiro Diocesano

No dia 4 de outubro a Diocese de Taubaté celebrou a festa de seu padroeiro, São Francisco das Chagas (ou de Assis). Ter um padroeiro é contemplar um modelo inspirador de vida cristã e de nossa resposta ao amor de Deus. Inspirado por São Francisco o atual Papa assumiu este nome para indicar sua disposição em realizar um pontificado marcado pela simplicidade e pela atenção aos mais pobres. Assim também nós, inspirados pelo Padroeiro, somos chamados a seguir Cristo que se fez pobre, dedicando-nos aos abandonados e ao cuidado da criação. Apoiado pela liturgia dessa festa reproduzo aqui elementos da reflexão feita naquele dia, que nos ajudam a tomar o exemplo de São Francisco para orientar nossa espiritualidade e nosso compromisso como cristãos situados no mundo de hoje.

Na primeira leitura (Eclo. 50, 1-7) temos um relato em que Simão, filho do sumo sacerdote Onias, restaura o templo do Senhor e fortifica a cidade. Esse relato nos traz à memória o episódio de Francisco que se sente chamado a restaurar o templo do Senhor, a pequenina capela de São Damião, que estava em ruína. Em meio a esse trabalho percebe que deve restaurar a Igreja de Cristo. São Francisco intuiu mais amplamente que a criação, como um todo, é lugar da presença de Deus, e deve ser respeitada. Isso vale especialmente para nossos dias em que a natureza é tão ameaçada e agredida.
Na segunda leitura (Gl6, 14-18) o apóstolo Paulo apresentava outro elemento que enriqueceria nossa reflexão sobre São Francisco, quando dizia: “trago em meu corpo as marcas da cruz”. São Francisco, por disposição própria, morreu para o mundo e o mundo para ele. As chagas, que trazia em seu corpo, eram sinais de sua união a Cristo na paixão e na morte diária de quem não queria mais viver para si, mas para os outros. “Já não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim”. O Apóstolo diz que importante é a nova criação redimida e restaurada na cruz de Cristo. Nessa cruz, onde morre o homem velho e surge o novo; onde a criação como um todo é renovada, é restaurada segundo o projeto original de Deus, que ao contemplar sua obra “viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31).

Na encíclica Laudato Si, o Papa Francisco destaca a figura de São Francisco e sua mística que compreende a criação restaurada como profunda harmonia do ser humano com Deus, com os outros, com a natureza e consigo mesmo. Em relação a si, o novo homem redimido por Cristo e segundo Sua imagem, compreende-se como filho, pobre, pequeno e servidor. Em relação a Deus, contempla-O como Pai, Criador, Salvador. Em relação aos outros, considera-os irmãos, a quem se deve dedicar especial predileção, sobretudo, quando pobres, pequenos e abandonados. Em relação ao conjunto da natureza, tudo é considerado obra de Deus, Sua criação, da qual somos parte. Somos irmãos de todos os seres criados, pois todos temos origem num só Deus, Criador e Pai. Esta concepção de Francisco não é romantismo, mas muda nossa relação com Deus, com as pessoas e com o mundo criado, condiciona nosso comportamento. Esta mística leva a superar a lógica decorrente do pecado que deturpa e distorce as relações fazendo ver Deus como aquele que limita nossa liberdade, o outro como um adversário ou um competidor a ser superado, o mundo como ambiente a ser, predatoriamente explorado. O novo homem redimido por Cristo tem atitudes de respeito, cuidado e preservação. Essa foi a lição que brotou da espiritualidade de São Francisco, apresentada pelo Magistério Pontifício da Igreja, a fim de nos inspirar hoje.

No evangelho (Mt 11, 25-30) Jesus diz: “Eu te louvo ó Pai porque ocultastes essas coisas aos grandes e cultos e as revelastes aos pequenos”. É feliz quem se compreende como parte de uma imensa criação que tem sua origem em Deus, pois esta pessoa tem a base para desenvolver sua existência em harmonia com Deus, com os outros, consigo mesma e com toda criação. Viverá com equilíbrio, encontrará a paz! “Que a paz e a misericórdia estejam sobre todos os que seguirem essa orientação”.

Dom Wilson Angotti
Bispo da Diocese de Taubaté

Fonte: O Lábaro – edição de outubro de 2016

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