Maria, a “cheia de graça”

A historia da salvação é uma caminhada de graça e esperança que culmina em Cristo. A teologia paulina da graça e da esperança nos leva por esse caminho: “aqueles que ele de antemão conheceu, também os predestinou a serem conformes à imagem de seu filho, a fim e que este seja o primogênito de uma multidão de irmão; e os que justificou, também os glorificou”(Rm, 8,30).

Na linguagem da Bíblia “graça” significa um dom especial, que, segundo o Novo Testamento, tem a sua fonte na vida trinitária do próprio Deus, de Deus que é amor (cf. 1Jo 4, 8). É fruto desse amor a “eleição”. Da parte de Deus essa “escolha” é a eterna vontade de salvar o homem, mediante a participação na vida divina (cf. 2 Pdr 1, 4) em Cristo. O efeito desse dom, dessa graça de eleição do homem por parte de Deus, é como que um gérmen de santidade, ou como que uma nascente a jorrar na alma do homem, qual dom do próprio Deus que, mediante a graça, vivifica e santifica os eleitos.

Quando lemos em Lucas 1,28 que o mensageiro diz a Maria “cheia de graça”, o contexto evangélico, no qual confluem revelações e promessas antigas, permite-nos entender que aqui se trata de uma “bênção” singular entre todas as “bênçãos espirituais em Cristo”. No mistério de Cristo, Maria está presente já “antes da criação do mundo”, como aquela a quem o Pai “escolheu” para Mãe do seu Filho na Encarnação e, conjuntamente ao Pai, escolheu-a também, o Filho, confiando-a ao Espírito de santidade. Maria está unida a Cristo, de um modo absolutamente especial e excepcional. A saudação “cheia de graça” dizem-nos tudo isso; mas, no contexto do anúncio do Anjo, referem-se em primeiro lugar à eleição de Maria como Mãe do Filho de Deus. Todavia, a plenitude de graça indica ao mesmo tempo toda a profusão de dons sobrenaturais com que Maria é beneficiada em relação ao fato de ter sido escolhida e destinada para Mãe do Cristo. Se essa eleição é fundamental para a realização dos desígnios salvíficos de Deus, a respeito da huma
nidade, e se a escolha em Cristo e a destinação para a dignidade de filhos adotivos se referem a todos os homens, então a eleição de Maria é absolutamente excepcional e única. Daqui deriva também a singularidade e a unicidade do seu lugar no mistério de Cristo.

Assim, pois, as nossas orações, apresentadas pela Virgem Santa, têm sem dúvida mérito, porque Maria é a única criatura que jamais ofendeu a Deus. Somente Nossa Senhora cumpriu o primeiro mandamento: um só Deus adorarás e amarás perfeitamente. Ela o cumpriu em sua totalidade. Tudo o que o Filho pede ao Pai lhe é concedido. Tudo o que a Mãe pede ao Filho lhe é igualmente concedido.

Na economia redentora da graça, atuada sob a ação do Espírito Santo, existe uma correspondência singular entre o momento da Encarnação do Verbo e o momento do nascimento da Igreja em Pentecostes. E a pessoa que une estes dois momentos é Maria: Maria em Nazaré e Maria no Cenáculo de Jerusalém. Em ambos os casos, a sua presença discreta, mas essencial, indica a via do “nascimento do Espírito”. Assim, aquela que está presente no mistério de Cristo como Mãe, torna-se – por vontade do Filho e por obra do Espírito Santo – presente no mistério da Igreja. E também na Igreja continua a ser uma presença materna, como indicam as palavras pronunciadas na Cruz (Jo 19,26-27): “Mulher, eis o teu Filho”; “Eis a tua Mãe”.

Diácono Sinésio Humberto de Siqueira

FONTE: O Lábaro – setembro 2014

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