O Ano da Fé

“É preciso voltar ao essencial e o essencial é Jesus Cristo” (Papa Francisco)

Um pequeno questionamento. A celebração do Ano da Fé chegou ao fim (24/11). A paróquia como instituição é ainda insubstituível, como sabemos e afirmamos. No entanto, sua renovação, urgentemente, necessária, pois não forma mistagogicamente seus filhos (as) para serem membros da Igreja, comunidade de fé, amor e de autêntica esperança. Nela não acontece como deveria a experiência de Deus, sem a qual continuamos a batizar novos, mas perdemos antigos, pouco transformamos e a transmissão da fé fica, sensivelmente, comprometida. Trento sancionou (1563) sessão XIV, com o Decreto de “reformatione” o Estatuto Jurídico da paróquia. Ela estava bastante baseada, principalmente, na autoridade do pároco e na recepção dos sacramentos. Vivemos hoje um novo paradigma. A secularização é um fenômeno em curso, o hedonismo e o consumismo também. O urbanismo, “rurbanismo”, a globalização, são fenômenos onipresentes.

A evangelização é deficiente, pois não valoriza, como deveria, o laicato, e sem seu aporte, como será a nova Evangelização? Circulamos nas mesmas ruas, mas não nos encontramos, como pessoas, e estas cristãs. A renovação paroquial – para tornar-se comunidade de comunidades não pode parar na paróquia – mas deve envolver a Igreja como um todo. Até agora a paróquia foi a última localização da Igreja como instituição. A necessidade de crescer na renovação é antiga. A Igreja tem consciência disto, mas não é fácil consegui-la. A Igreja tem consciência da necessidade de repensar a Evangelização, mas tem dificuldade de encontrar os caminhos para a ação. Já afirmava o Papa Clemente I (88-97): “Renovar-se é preciso”. A Conferência de Santo Domingo (1992), já indicava um caminho “a nova evangelização” a exigia conversão pastoral, nº 30. E o Doc. de Aparecida também a pede, (DAp 384). Bento XVI, o que nos diz, entre outras coisas? “A paróquia deve tornar-se hospitaleira, sendo aberta à aproximar-se dos homens. Criar espaços para a Palavra tornar-se compreensível e realista” (26/02/2009).

“Agere sequitur esse”, logo a conversão pastoral exige, prioritariamente, outra: a conversão a Cristo. Ele chamou os doze para permanecerem com Ele e depois os enviou (cf. Mc 3,13-15). Saulo, antes de se tornar Paulo, foi ao deserto (Gl 1,17). O Papa Francisco falou da necessidade da conversão ao essencial, e este, é Jesus Cristo. As Diretrizes da CNBB, em seu objetivo geral, falam do partir de Cristo, na força do Espírito Santo como Igreja discípula, missionária (enviada) e profética. Se a fé e a evangelização são libertação, o são na medida em que o são: autolibertadoras, ou seja, libertar é libertar-se para… O modo de ser diferente dos cristãos, não se dá pelo distanciamento, pela língua, vestuário etc. O que diz o autor da Carta a Diogneto? “Os cristãos não se diferenciam dos outros pelo território, nem pela língua e hábitos… não tem cidades próprias… sua doutrina não é elucubração de pessoas curiosas, mas que mostram caráter admirável e extraordinário… participam de tudo como cidadãos e tudo suportam como estrangeiros…. cada terra estrangeira é sua Pátria e cada Pátria é terra estrangeira. Casam-se como os outros, mas não expõem os neonatos. Tem em comum as refeições, mas não suas camas. Estão na carne, mas não vivem segundo a carne. Vivem na terra como cidadãos do Céu… São pobres, mas enriquecem a muitos, e mostram a justiça pela vida… Eles são no mundo como a alma no corpo…” (cf. Carta a Diogneto).

 Outrora era assim… E hoje? Como está o Cristianismo? Não só falo do catolicismo. Sabemos conviver sendo fieis a Cristo e ao Evangelho, pagando o custo de tudo isto? Estamos divididos como cristãos, mas até que ponto unidos como católicos? Como Igreja? Como ministros ordenados? Como vida consagrada? Um grande pensador francês afirma que aos cristãos falta um “suplemento de alma”. Suplemento? A alma não é apenas suplemento, é a forma do nosso ser cristão. Nós sabemos bem de nossas doenças, mas nem sempre do remédio a ser procurado, pois não consultamos o médico devido, não por falta de INPS, mas, frequentemente, por falta de consciência. Somos inautênticos.

Concluindo:

O que o Ano da Fé nos fez descobrir? Que ela é dom de Deus? Mas também que é colaboração nossa? Que somos chamados à santidade, mesmo que, talvez, não à canonização. Penso que, às vezes, tenhamos medo da verdade. O que afastou membros de nossas dioceses, do curso em Passa Quatro? “Encontro comigo, com o outro e com Cristo”, foi o custo? Não. Talvez porque nos faria perceber nossas lacunas? “Justus meus ex fide vivit” (Rm 1,17; Gl 3,11). Teremos Nova Evangelização quando nós formos de certo modo novos renovados. Teremos paróquias renovadas quando nós formos renovados.

Para comunicarmos melhor, precisamos de novas tecnologias, sem esquecer que o melhor instrumento de comunicação é a vida exemplarmente cristã, cultivando os mesmos sentimentos de Cristo. Precisamos de “Fide et Ratio”, mas também de “Passio et actio”. Paixão por Cristo e seu Reino. Precisamos cultivar melhor nossa identidade de filhos de Deus, de acordo com nossos carismas.

Dom Carmo João Rhoden, sjc

Bispo de Taubaté

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