Evangelização e Missionariedade

“Necessitamos desenvolver a dimensão missionária da vida de Cristo. A Igreja necessita de forte comoção que a impeça de se instalar na comodidade, no estancamento e na indiferença, à margem do sofrimento dos pobres do Continente. Necessitamos que cada comunidade cristã se transforme num poderoso centro de irradiação da vida de Cristo. Esperamos em novo Pentecostes que nos livre do cansaço, da desilusão, da acomodação ao ambiente; esperamos uma vinda do Espírito que renove nossa alegria e nossa esperança” (cf. DAp 362);

“Os bispos, presbíteros, diáconos permanentes, consagrados e consagradas, leigos e leigas, são chamados a assumir atitude de permanente conversão pastoral, que implica escutar com atenção e discernir “o que o Espírito está dizendo às Igrejas” (Ap 2,29) através dos sinais dos tempos em que Deus se manifesta”. (cf. DAp 366)

Introdução

Nunca, discipulado, evangelização e missionariedade podem ficar desligados da missão, mormente, da do Presbítero. Ele é, sempre, ou ao menos deve ser, um profeta que leva aos irmãos o que ouviu do Senhor. É um enviado a falar em nome do Senhor. Ai dele se não o fizer. Além do mais, é um pastor que conhece suas ovelhas e estas o conhecem. Vai em busca das mesmas, alimentando-as, dando sua vida por elas, como o Mestre. Ele, além de tudo, faz de sua vida um culto vivo, amoroso e contínuo a Deus. Como Cristo. Com Ele, exclama-oblações e sacrifícios não quisestes, mas me destes um corpo. Eis me aqui – ó Senhor para fazer vossa vontade. Está escrito no livro que devo, ó Deus, fazer vossa vontade (cf. Hb 10,5-9). É a dimensão sacerdotal. A vida dos ministros ordenados é cumprir a missão assumida. Fora desta pauta, ela se torna insípida, preocupante, quando não traidora mesmo. As tentações do mundo atual são onipresentes e atraentes. Só Presbíteros muito lúcidos, apaixonados por Cristo, e bem atuantes as percebem, mesmo que todos as sintam.

Reflexão a partir da Evangelii Gaudium

O Papa surpreende logo em sua Exortação Apostólica. Ela não é, e nem quer ser, uma espécie de tratado teológico, mas um convincente apelo à conversão, à renovação, a sair de si, a assumir de modo vital a missão e a vivê-la com alegria. É Exortação Apostólica de um Papa Pastor: Pastor Latino-Americano. Quer que todos saiamos em missão. Ele sabe que vivemos numa época de individualismo, consumismo, de prazeres, de superficialidade e mesquinhez. Por isso, somos chamados e enviados a construir o Reino. Como testemunhas. Os discípulos devem, pois, ser fiéis, alegres, caridosos e missionários. A nota mais característica do cristão é a alegria (cf. EG 4 e 5). O Papa recorda umas 161 vezes “a realidade da alegria”. Esta o faz assumir sua missão: ele não pode não falar, nem fazê-lo, senão com alegria, como Cristo, como Maria (cf. Lc 1,28-47). Paulo pede que sejamos alegres (Fl 1,4).

De fato, não podemos viver de modo diferente. Quem encontrou Cristo é feliz. Sente-se amado, valorizado e enviado. Torna-se um apóstolo e com Paulo exclama: “Ai de mim se eu não evangelizar” (cf. 1 Cor 9,16).

O Papa deixa claro que a vida somente na medida em que é doada é vivida. É comunicada. O Papa sabe também que os sofrimentos surgem na missão, pois fazem parte da mesma. Devemos semear até com lágrimas, como os Apóstolos, os Mártires.

O Papa, portanto, deseja uma renovada evangelização. Por quê? Porque Deus em Cristo, pelo coração de Cristo, mostrou todo seu amor por nós. Mas Cristo é, além do mais, também o primeiro e maior evangelizador (EG- 12) que nos amou por primeiro (cf. 1 Jo 4,19). Logo nos cabe corresponder. Mas qual é o objetivo da nova evangelização? A retransmissão da fé a todos e todas, aos crentes, ou que se dizem crentes, mas não praticam a fé, e aos afastados que não conhecem Cristo. Recorda o Papa que, a Evangelização, é a tarefa primeira da Igreja, ou a causa missionária deve ser a primeira das causas (cf. EG-15). Já não o havia dito, de modo semelhante, o Papa Paulo VI? Sim: “A Igreja existe para evangelizar”… (cf. E. Nuntiandi).

Até que ponto isto é por nós assumido? Como organizamos nossa vida e ação pastorais? Onde gastamos nosso tempo? Podemos afirmar: “evangelizare misit me Dominus?

O Papa não nos quis apresentar um simples exame de consciência, mas também não deixou nada barato. Quem somos, e o que fazemos nós? Apenas administradores paroquiais, ou missionários e testemunhas? Cada qual deverá examinar-se, pois, Cristo e a Igreja, esperam por evangelizadores. O Papa fala em Evangelizadores com espírito (EG-259)

Motivação para um renovado impulso missionário (cf. EG-262 ss)

A firma o Papa que evangelizar com espírito é vibrar com a verdade anunciada. Por isso, ele mesmo invoca o Espírito Santo para que venha renovar, sacudir, impelir a Igreja a uma decidida saída para fora de si mesma. Afirma, ainda, que isso só se consegue, tendo vida interior, momentos de adoração… encontros orantes com a Palavra, diálogo sincero com o Senhor. A oração é o pulmão da Igreja evangelizadora (EG-262) que se alimenta da leitura orante e de adorações perpétuas, sem cair num intimismo (262). Não devemos tornar-nos derrotistas. Lembremos o tempo do Império Romano, e como os cristãos, de então, com alegria, e até com o martírio evangelizaram (EG 263). Nossos tempos não são mais difíceis, são diferentes, afirma então o Papa. Pede que olhemos ainda para os Santos e para o modo como enfrentaram os tempos difíceis.

No 264, o Sumo Pontífice, nos pede que alimentemos um encontro pessoal com o amor de Jesus. Ninguém pode dizer que ama e se sente amado, se, por sua vez, não ama. Cristo já nos cativou, mas também nós devemos cativá-Lo, com nosso coração. Ele insiste numa relação amorosa, cultivada e perseverante com o Senhor que nos chamou dizendo: “Vinde e vede”. Devemos tornar-nos contemplativos, recuperando o “espírito contemplativo”.

Na evangelização o Espírito já nos precedeu. Nos corações humanos existe uma ânsia, talvez, inconsciente, de conhecer a verdade. Infelizmente, nem sempre, nós estamos convictos do tesouro que temos. Nossa infinita tristeza só se cura com um infinito amor (265). Penso que os números citados, sejam os mais belos da Exortação. Insiste ainda dizendo: nada, nada mesmo, substitui a experiência pessoal do encontro, constantemente renovada de saborear sua amizade e sua mensagem (266). Aliás, neste número dá ainda outros belos exemplos do amor de Cristo, pelos Santos correspondidos. Eles buscaram a Glória do Pai. Nós devemos, com Cristo, fazer o mesmo (267).

Conclusão

Cabe, então, perguntar-nos: Sentimo-nos cativados por Cristo continuamente chamados e com insistência enviados? Uma coisa é certa: sem sentir-nos profundamente amados por Cristo, não corresponderemos, não conseguiremos ser fiéis.

Então, como estamos nós? A Diocese está em mãos de evangelizadores/missionários? De testemunhas enamorados e convictos? A Evangelii Gaudium nos está provocando? Sejamos coerentes, o Papa quer mexer com a Igreja. Logo, também, com a Diocese e com nossas paróquias. Isto exige conversão minha, vossa, nossa. Conversão a Cristo e à missão. Cristo a espera e, certamente, a merece. Concluindo, invoquemos com o Papa a Maria:

“Estrela da nova evangelização, ajudai-nos a refulgir com o testemunho da comunhão, do serviço, da fé ardente e generosa, da justiça e do amor aos pobres, para que a alegria do Evangelho chegue até os confins da terra e nenhuma periferia fique privada da sua luz”. (EG – 288)

Dom Carmo João Rhoden, SCJ – Bispo de Taubaté

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